30 de outubro de 2015

A última palavra

O Presidente da República respeitou, no meu entendimento, os resultados das eleições legislativas ao indigitar o líder do partido mais votado para formar governo.

Por outro lado, na mesma comunicação ao país, faz duas coisas que me parecem inconciliáveis: diz que dá a última palavra aos deputados e, ao mesmo tempo, recusa qualquer governo apoiado pelo BE e pelo PCP.

Dar a palavra aos deputados não é isto. Não é só uma figura de estilo. É a democracia a funcionar na sua máxima plenitude.

Num regime como o nosso, o Presidente da República tem alguns poderes, mas não pode, nem deve, ignorar o poder da Assembleia que é o reflexo mais fidedigno da vontade do povo. O povo, o tal que mais ordena, votou nos seus representantes e esses têm, na Assembleia da República, a obrigação de os representar, quer na recusa de prolongar por mais tempo o que se passou nestes últimos quatro anos, quer na construção de uma alternativa em que devolva a esperança aos Portugueses.

Por isso, quando o Presidente diz que a última palavra cabe aos deputados não pode construir, ao mesmo tempo, um muro para dividir a esquerda, separando os eurocéticos dos restantes. Será que não se lembra do período eurocético do CDS e do seu líder? Não foi assim há muito tempo e não lhe causa qualquer prurido, pelo menos que se saiba…

Sabemos que há quem queira que estas coisas sejam feitas com base na tradição. Aliás esta palavra foi uma das mais utilizadas na passada sexta-feira, dia da instalação da Assembleia da República, pelos dois partidos da coligação.

Os Portugueses também estavam habituados, tradicionalmente, a receber o subsídio de férias e o subsídio de natal. Estavam habituados, também tradicionalmente, a respeitar os feriados nacionais, onde se incluíam o 5 de outubro, o 1 de novembro, o 1 de dezembro e o dia de Todos os Santos. Os pensionistas davam como certa a tradição de não lhe mexerem nas pensões.

Conclusão, as tradições já não são o que eram. Se o governo cair, deem a palavra, a última, ao Parlamento e deixem a democracia funcionar.

23 de outubro de 2015

O último tabu

Desde que são conhecidos os resultados das eleições do passado dia 4 de outubro de 2015 que sempre achei que o partido mais votado, neste caso uma coligação de dois partidos, ia ser chamado a formar governo. Desde a revolução de abril tem sido sempre assim.

Também nunca duvidei que essa seria a opção do Presidente da República, apesar do tabu que alimentou durante os últimos dezanove dias. No entanto a sua atitude em todo o processo não é, de todo, muito positiva, mas - do mal, o menos - fica em linha do que tem feito atá aqui.

O certo é que caiu na contradição do que disse antes das eleições: que não daria posse a um governo sem maioria estável na Assembleia da República. Mais vai fazê-lo, de acordo com o anúncio que fez ontem numa comunicação ao país que mais parecia um apelo à segregação de uma parte da esquerda e uma ameaça velada ao Partido Socialista.

Todos nós temos o direito de mudar de opinião, é verdade, e só não muda de opinião quem não a tem. Mas estamos a falar das afirmações de um Presidente da República que, para uns mais do que outros, são, ou pelo menos deviam ser, uma referência de estabilidade e isenção, especialmente num momento político complexo como o que estamos a atravessar neste momento.

Ao anunciar a indigitação de Passos Coelho para formar governo, o Presidente derruba a solução de esquerda, considerada por ele como inconsistente, que, segundo parece, tinha um acordo para os quatro anos da legislatura.

A responsabilidade foi atirada, definitivamente, para a Assembleia da República, aliás o sítio certo para dirimir esta contenda. Não podemos esquecer que os Portugueses elegeram deputados com mandatos e não o primeiro-ministro, e cabe a eles, só a eles, no seio parlamentar, conseguir uma maioria estável para governar o país.

Podemos adivinhar vários cenários, dois, pelo menos. No entanto podemos ter a certeza que este deve ter sido o último tabu de Cavaco Silva.

16 de outubro de 2015

Os dias depois

 A aliança Portugal à Frente festejou efusivamente a vitória na noite eleitoral do passado dia 4, com toda a legitimidade democrática, mas sem sequer se aperceber do que poderia vir a seguir, talvez embalada pelo pensamento de que estas eleições estavam para ser favas contadas.

Sem conseguir a ambicionada maioria absoluta para formar um governo estável, como pretende e exige o Presidente da República, a coligação não procurou, ou não quis procurar, qualquer solução no dia a seguir às eleições, pensando, talvez, que seria desnecessário.

Nessa fase não se viu qualquer esforço por parte da coligação, que assistiu paralisada e incrédula às movimentações de todos os partidos à sua esquerda que, numa primeira análise, defendiam um governo alternativo.

É evidente que o PSD, partido que, como se sabe, é o maioritário na coligação, lançou mão de tudo para desvalorizar aquelas movimentações, nomeadamente utilizando os “seus” comentadores políticos que pululam nas redações de televisões, rádios e jornais, aí sim, numa clara e inequívoca superioridade, apelando ao cumprimento dos preceitos da Constituição Portuguesa, esquecendo-se que foram estes dois partidos que, nestes últimos quatro anos, mais atropelos cometeram à lei fundamental do Estado desde a revolução de Abril.

No meu modesto entendimento, a aliança do PSD/CDS-PP, no caso de não haver outro tipo de solução, deve e vai ser chamada a formar governo e depois se verá o que vem a seguir, nomeadamente se haverá capacidade e habilidade para estabelecer pontes com os outros partidos para viabilizar a sua ação governativa.

Se não resultar sabe-se que pode haver um entendimento à esquerda e essa solução será, também ela, legítima, havendo, inclusivamente, casos idênticos em vários países da Europa.

Uma coisa podemos ter a certeza: a dupla Passos Coelho e Paulo Portas, durante os próximos tempos, não governará com a mesma arrogância com que o fez nos últimos quatro anos.

9 de outubro de 2015

Depois do sufrágio

A contagem dos votos do passado dia 4 de outubro dá a vitória à coligação PSD/CDS-PP mas sem maioria absoluta. O povo, na sua grande maioria, votou à esquerda, dispersou os seus votos pelo Partido Socialista e outros partidos que têm uma coisa em comum: todos rejeitam a austeridade.

Perante este imbróglio eleitoral uma coisa podemos ter a certeza: o próximo orçamento não será como os últimos, que foram de triste memória. Não teremos, portanto, medidas gravosas impostas unilateralmente contra tudo e contra todos. Essa é a grande virtude deste resultado expresso nas urnas.

O Presidente da República, no seu melhor estilo, chamou o chefe do seu partido e deu-lhe indicações para formar um governo estável, mas apressou-se a excluir da solução, numa comunicação à nação, os partidos à esquerda do Partido Socialista. Este seu gesto criou um muro a dividir os Portugueses de direita e esquerda.

Por outro lado, António Costa, no meu modesto entendimento, fez muito bem em recusar demitir-se perante os resultados eleitorais. Fê-lo, tenho quase a certeza, pelo sentido de responsabilidade e pelo papel preponderante que o Partido Socialista terá de desempenhar nos tempos mais próximos. A definição da liderança, importante também, terá o seu tempo, mas não pode interferir neste processo que, por si só, é complexo e exige a melhor atenção dos responsáveis políticos.

As primeiras declarações de António Costa, logo a seguir às eleições, foram esclarecedoras: não alinharia em maiorias negativas nem inviabilizaria governos se não tivesse um governo para viabilizar.

O sentido de estado que se pode perceber da sua atuação, nesta altura, é tão diferente de outros que em 2010/2011 apenas pensavam no assalto ao poder a qualquer preço. E o preço foi muito alto, como se sabe.

2 de outubro de 2015

O outro caminho

Durante os últimos longos quatro anos foi exigido aos Portugueses enormes sacrifícios por este Governo de Passos Coelho e Paulo Portas, sobretudo por via do agravamento fiscal, e chegados aqui percebe-se que afinal não serviram para nada.

Cresceu a dívida pública, alvo de grandes críticas no passado, subiu o défice público, apesar das manobras do Governo para o esconder dos cidadãos, continua a saga da emigração, que está ao nível dos máximos históricos atingidos nos anos 60.

Há outro caminho. Tem de haver outro caminho em que se procure a consolidação orçamental sem prejuízo das pessoas e das empresas, sem humilhar os idosos, sem empurrar os jovens para o estrangeiro. Tem de haver uma alternativa a esta direita que empobreceu o país, destruiu a classe média, enquanto criou mais 30% de grandes fortunas.

O Governo do PSD/CDS-PP falhou em todas as metas a que se propôs em 2011, apesar dos sacrifícios que impôs aos Portugueses e agora, como é normal em democracia, tem de ser julgado por isso.

É evidente a força imensa que Passos Coelho e Paulo Portas dedicam a dourar o atual estado de coisas, utilizando a mentira e a demagogia barata.

No próximo domingo, dia 4 de outubro, está na nossa mão mudar o país, devolver a esperança e a dignidade aos Portugueses.

O voto é sagrado. O voto é secreto. Não há que ter medo das pressões dos poderosos, não liguem ao pobre coitado que faz campanha só a falar mal de pessoas, não deixem que os enganem com a paternidade do que acontece de bom, não se deixem levar por sondagens.

Que ninguém fique em casa.