Gui Heber Bettencourt
Louro
(13/02/1936 –
16/04/1982)
No dia 11 de julho de 1981 estava
a cumprir o serviço militar em S. Miguel. No quartel da Castanheira preparei-me
para ver na televisão do bar um momento importante para todos os Graciosenses:
a inauguração do aeroporto.
Nesse tempo, e até essa altura, a
mobilidade de pessoas e bens acontecia unicamente por via marítima. Eram os
tempos de glória do velhinho Ponta Delgada, que, até aí, aportava em todas
ilhas, primeiro de oriente para ocidente e depois ao contrário. Nos verões
havia o reforço das ligações marítimas feitas pelos barcos Espírito Santo,
Santo Amaro e Terra Alta, que, em vagarosas viagens, iam resolvendo as nossas
necessidades mais prementes, por vezes em condições bem severas, que faziam de
cada viagem uma aventura que, quando contada aos amigos, podia dar uma história.
Naquele dia todos os caminhos iam
dar ao novo aeroporto e a população acorreu em força, passando pela antiga
canada Nova, agora transformada numa bonita estrada, em direção á recém-construída
aerogare, para apreciar a primeira aterragem de um avião comercial nesta ilha e
depois ouvir os discursos da praxe, integrados na cerimónia oficial.
Estavam presentes as mais altas
individualidades dos Açores e o primeiro-ministro de Portugal, Dr. Pinto
Balsemão. Sinceramente não me recordo, de todo, da ordem das intervenções. Sei
que foi o senhor Gui, presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz da Graciosa
da altura, que chamou à atenção de todos os presentes e daqueles que viram através
da televisão, como eu. Fez um discurso interrompido, de quando em vez, por
silêncios em que fartas lágrimas escorriam pelo seu rosto. A emoção tomou conta
de muitos dos presentes, que, naquele momento, também sentiram um aperto no
peito. Foi a intervenção, de corpo e alma, de um homem que representava o seu
povo num momento histórico em que se rompia definitivamente com um isolamento
de séculos. O próprio primeiro-ministro referiu esse momento com uma contida
emoção.
O senhor Gui Louro foi um dos
fundadores nesta ilha do Partido Popular Democrático, agora designado por
Partido Social Democrata, e em 12 de dezembro de 1976, data das primeiras
eleições autárquicas após a revolução dos cravos, é eleito Presidente da Câmara
Municipal de Santa Cruz da Graciosa. Em 16 de dezembro de 1979 é reeleito e
exerce o cargo até ao dia da sua morte.
É na qualidade de responsável
autárquico que assiste a outros momentos importantes para a nossa ilha, como a
entrada em funcionamento do porto comercial e a inauguração do entreposto
frigorífico que, juntamente com o aeroporto, faziam parte dos primeiros grandes
investimentos perpetrados depois da conquista da autonomia dos Açores.
O sismo de 1980 foi outro
acontecimento que viveu enquanto exercia funções públicas. Foi um momento
dramático, sem dúvida, que exigiu dele uma entrega extraordinária tendo em
conta a necessidade de organizar todo o processo de reconstrução.
Impulsiona a constituição da
Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários da Ilha Graciosa, da qual foi
sócio fundador. Conta-se que no dia do desembarque da primeira viatura dos
bombeiros, feita ainda com o barco ancorado, o comandante do navio ter-se-á
recusado a fazer a descarga devido aos riscos que a operação envolvia e foi o
senhor Gui Louro que se deslocou ao porto para se responsabilizar pessoalmente
por aquela manobra. Hoje essa viatura, embora já fora de serviço, ainda ostenta
o seu nome.
Nas suas andanças na atividade
política foi ainda, durante um mês, Deputado na Assembleia Regional dos Açores.
Antes de se dedicar à vida
pública o senhor Gui foi funcionário do tribunal e, nessa qualidade, chega a
viver alguns anos na vizinha ilha Terceira. Quando regressa dedica-se ao
comércio e, mais tarde, concorre e exerce funções na Fundação Calouste Gulbenkian
que, como se sabe, tinha uma biblioteca itinerante que percorria toda a ilha na
busca de leitores. Nessa altura obtém a carteira profissional de solicitador
função que exerce em acumulação. Os conhecimentos que possuía nessa área
foram-lhe muito úteis aquando das expropriações dos terrenos onde foi
construído o aeroporto.
Nos seus tempos livres gostava de
participar em caçadas com os amigos, que acabavam, invariavelmente, em alegres
jantaradas. O mergulho também era uma das suas paixões, chegando a dizer aos
seus mais próximos que era no mar que se sentia verdadeiramente livre. Dedicava
também algum tempo a tratar da sua coleção de selos.
O senhor Gui Louro foi um
político determinado e que acreditava no que fazia. Era intransigente quando
estava em causa a defesa da sua amada ilha. Ao mesmo tempo era um sonhador e homem
de paixões. Pela sua terra fez o melhor que soube e pôde, sem nunca esperar nada
em troca.
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