26 de abril de 2012

Abril sempre


Na primavera de 1974 muitas foram as esperanças depositadas no futuro de Portugal. O país abria-se ao mundo, enquanto se dava por finda uma guerra que matou e mutilou muitos concidadãos. A educação foi alargada a todos tal como a saúde passou a ser um direito de todos os portugueses. Os trabalhadores conquistaram direitos até então proibidos. Foram o 13º e 14º meses, os vínculos às entidades patronais, o apoio na maternidade, a igualdade de oportunidades, a dignificação das carreiras profissionais, a valorização dos salários, os direitos de aposentação, o direito à greve, entre outros. A implementação de políticas de proximidade através do poder local e a liberdade de expressão foram também importantes conquistas.

Eram estes os ideais de Abril que levaram os corajosos militares à rua para derrubar um regime déspota e promotor de desigualdades a todos os níveis. O povo cedo percebeu o que estava em causa e, desde logo, deu o seu inteiro apoio ao Movimento das Forças Armadas nesta revolução dos cravos.

Nestes trinta e oito anos a democracia portuguesa sofreu contratempos, com avanços e recuos, mas nunca esteve tão ameaçada como agora.

Todos os dias o Governo da República impõe medidas que vão no sentido de desmantelar essas conquistas. Os trabalhadores a cada dia que passa perdem direitos que são inalienáveis, ou pelo menos eram até há bem pouco tempo.

A desregulamentação do trabalho, a mobilidade de qualquer maneira, os encargos com os despedimentos a preços de miséria, o corte dos subsídios de férias e de natal, o congelamento das reformas antecipadas, o aumento desmesurado de impostos, são o pão não de cada dia. Depois vem a perigosa tentativa de liquidação do Serviço Nacional de Saúde e as restrições do acesso à educação. A reforma autárquica, feita a régua e esquadro sem qualquer respeito pelas especificidades, vai destruir, de uma forma indecorosa, a matriz identitária de muitas comunidades.

Estas medidas não só colidem com o espírito de Abril, como foram elas o motivo pela qual os militares saíram às ruas deste país.

E não me venham com a desculpa da troika, porque grande parte destas armas com que o Governo de Passos Coelho combate o seu próprio povo, estão para lá do exigido pelo memorando assinado com as instâncias internacionais.

Compreendo aqueles que faltaram à cerimónia oficial das comemorações do 25 de Abril, porque ainda nos resta esse direito, o direito à indignação.

25 de abril de 2012

Pioneiro na hotelaria


Brivaldo Bettencourt Santos

(21/06/1895 – 17/11/1984)
Naquele tempo, crianças com éramos, parecíamos todos felizes. Nas férias brincávamos de manhã até à noite, apenas com uns intervalos para as refeições. Em altura de escola aproveitávamos os tempos que nos davam os nossos pais para brincar e jogar. E não se pense que eram brincadeiras simples. Exigiam de nós força, destreza física, resistência, imaginação e espírito de grupo.

Não tínhamos computador ou play station. Não havia televisão e os livros eram poucos. Mas mesmo assim tínhamos uma panóplia de jogos à nossa disposição, como a barra, o rato de sociedade, o pião, a navalha e, por último, o quartel-general, que nos entretinham durante todo o ano, revezando-se por épocas estabelecidas por nós de forma quase automática e de maneira a nunca fartar. Para além destes, ainda havia tempo para corridas com babosas no íngreme cerrado do senhor Carlos da Marina no Monte da Ajuda ou com carros de ladeira.

Quando íamos para os lados do Coval para mais umas corridas, passávamos pela Pensão Graciosa, do senhor Brivaldo Santos. Pela manhã aquele cheirinho a café de cevada, que vinha da sua afamada cozinha, invadia a rua.

Dos cinco quartos da Pensão Graciosa quatro ficavam no primeiro andar e um no rés-do-chão. Todos tinham um lavatório de louça encastrado em armações de ferro, onde se viam as toalhas impecavelmente dobradas. Das alvas camas sobressaía a dobra dos lençóis com lindos bordados. A escada e o corredor estavam forrados com plantas. No rés-do-chão havia uma loja que era usada pelos inúmeros caixeiros-viajantes que demandavam esta ilha, como mostruário dos seus produtos para serem apreciados pelos comerciantes locais.

Era nessa loja, quando não estava ocupada pelos clientes, que o filho, Valdemiro Santos, e o sobrinho, Luís Avelino, montavam uma sala de cinema, destinada a jovens, com filmes de oito milímetros, normalmente do Bucha e Estica. Um escudo era o suficiente para pagar a entrada e mais alguns centavos davam para um copo de sumo e as pipocas da praxe. Passávamos assim as tardes de domingo.

Muito antes, e tal como muitos jovens da sua idade, o senhor Brivaldo teve de emigrar, quando tinha apenas 18 ou 19 anos de idade. O Brasil foi o seu destino. Regressa quando perfaz 25 anos e emprega-se numa chapelaria instalada nos baixos da antiga casa do senhor Eurico Vieira da Costa.

No início dos anos vinte resolve abrir uma pensão. O Carapacho foi local escolhido para instalar o primeiro estabelecimento do género na ilha, impelido pelo despertar da procura das águas “milagrosas” daquela zona. Não deve ter sido fácil empreender tal estrutura num local que, na altura, era de difícil acesso. Em 1924 inaugura a Pensão Graciosa, na casa da família do senhor José Araújo. É nessa altura que a sua cozinha ganha fama. Passaram por lá excelentes cozinheiros como o Carlos Pereira Valentim ou o Caetano Álvaro da Cunha. Consta que este último terá sido convidado a ir até Lisboa pelo Presidente da República de então, General Craveiro Lopes, aquando da sua visita a esta ilha em julho de 1957, precisamente por ter gostado do que comeu. Caetano Álvaro da Cunha fez a sua carreira no Palácio de Belém, onde chegou a chefe de cozinha.

O senhor Brivaldo optou depois por reduzir a atividade e transferiu a Pensão Graciosa para o Coval, donde partimos para esta nossa pequena crónica.

Além da sua vida profissional, fez parte das primeiras direções do Graciosa Futebol Clube. No entanto é na Filarmónica Recreio dos Artistas, agora quase a completar cem anos de existência, que exerceu mais cargos. Foi mestre de sala, função que, naquele tempo, era considerada importante pelo papel na organização das festas, sobretudo bailes. Destacou-se também como ensaiador e ator do grupo de teatro daquela instituição, tendo, numa ou noutra qualidade, levado à cena, entre outras peças, “O Amigo de Peniche” e ”Na Boca do Lobo”. Ainda coreografou inúmeras fantasias de carnaval que se apresentavam em todos os clubes da ilha.

O senhor Brivaldo Bettencourt Santos foi, sem dúvida, um pioneiro na hotelaria e um dinamizador cultural, que merece ser destacado pelo espírito empreendedor e pela sua entrega ao serviço da comunidade Graciosense.

19 de abril de 2012

Regresso ao passado


Da magna reunião do PSD-A que ocorreu no passado fim-de-semana esperava-se muito mais. E esperava-se sobretudo porque este partido tem legitimas ambições de chegar ao poder no próximo escrutínio, que ocorrerá em outubro do corrente ano. No entanto quando terminou este congresso os açorianos apenas puderam chegar a três conclusões óbvias:

- a dra. Berta Cabral é devota do Espírito Santo;

- Passos Coelho não sabe o primeiro nome da dra. Berta Cabral;

-a dra. Berta Cabral quando fala em mudança e renovação é a brincar.

A devoção que nutre pelo Espírito Santo é de respeitar e ponto final. Agora o anúncio de que só deixará a Câmara Municipal de Ponta Delgada depois das festas em seu louvor, deixa muitos açorianos desconfiados relativamente a uma manobra, mais uma, de mero oportunismo político. Foi dito que tem uma boa capacidade de trabalho e que consegue conciliar as duas funções, autarca a tempo inteiro e candidata a presidente do governo. Este dom da ubiquidade permite-lhe, segundo se infere das entrevistas pós-congresso, dirigir uma autarquia e ao mesmo tempo andar de ilha em ilha em campanha, restando ainda algum tempo para dar uns saltinhos ao estrangeiro.

Depois vem a troca do primeiro nome da dra. Berta Cabral perpetrado pelo seu mentor, Passos Coelho. É vulgar esquecermo-nos do último nome de pessoas amigas ou conhecidas, mas trocar o primeiro é grave.  

Por último vem a história da renovação para a mudança. Já vi renovações mais ou menos, já vi renovações tímidas ou renovações parciais, mas, sinceramente, nunca tinha visto uma renovação que é uma espécie de regresso ao passado. Foi uma autêntica repescagem de gente com mais de trinta anos de atividade política.

Esta nunca nos tinha passado pela cabeça.

12 de abril de 2012

Do empenho à mentira


Quanto mais perto do período eleitoral mais as coisas mudam, já se sabe. Mais empenho, mais ideias, mais opiniões, mais visitas, mais sorrisos, mais palmadinhas nas costas, enfim, os partidos apresentam-se com uma dinâmica diferente, com mais disponibilidade e com maior sensibilidade para resolver os problemas dos cidadãos.

Embora haja quem não concorde, esta postura é perfeitamente normal nas democracias. É nessa altura, no fim das legislaturas, que os partidos políticos tentam passar a mensagem do que defendem e o que farão caso vençam as eleições. Esta estratégia, sendo bem aproveitada, pode até contribuir para a conceção dos manifestos eleitorais, amplificando, deste modo, a vontade popular.

O problema é que nem sempre é assim tão linear.

Há gente por aí que teima em recorrer a qualquer meio para tentar aproveitar estes momentos para espalhar inverdades de variadíssimas maneiras. Umas vezes a coberto de formas oficiais e outras não. Não sendo invulgar é, no entanto, um método indigno destinado a ludibriar as pessoas mais incautas que se atemorizam com estas posturas. Socorrem-se de outros que, por sofrerem de partidarite aguda, lhes passam informações de forma deturpada, fruto de recalcamentos antigos.

É assim. Daqui para a frente vamos ver um pouco de tudo, infelizmente. Desde falsificações de documentos até conspirações para se ver quem se vai tramar a seguir, algumas consumadas nas próprias instituições que lhes pagam os salários, vamos ver de tudo.

Não podemos, no entanto, permitir que esta prática vingue. Os partidos da nossa praça devem condenar liminarmente estes processos baixos e rejeitar esta gente que, sem ponta de coragem para assumir o que fazem, refugiam-se nestes métodos muito pouco éticos.   

Por isso é necessário estarmos todos atentos e não deixar passar impunemente estas manobras, venham de onde vierem. Uns serão responsabilizados politicamente à boca das urnas, enquanto os outros terão de assumir as consequências dos seus atos.

10 de abril de 2012

Político determinado



Gui Heber Bettencourt Louro

(13/02/1936 – 16/04/1982)

No dia 11 de julho de 1981 estava a cumprir o serviço militar em S. Miguel. No quartel da Castanheira preparei-me para ver na televisão do bar um momento importante para todos os Graciosenses: a inauguração do aeroporto.

Nesse tempo, e até essa altura, a mobilidade de pessoas e bens acontecia unicamente por via marítima. Eram os tempos de glória do velhinho Ponta Delgada, que, até aí, aportava em todas ilhas, primeiro de oriente para ocidente e depois ao contrário. Nos verões havia o reforço das ligações marítimas feitas pelos barcos Espírito Santo, Santo Amaro e Terra Alta, que, em vagarosas viagens, iam resolvendo as nossas necessidades mais prementes, por vezes em condições bem severas, que faziam de cada viagem uma aventura que, quando contada aos amigos, podia dar uma história.

Naquele dia todos os caminhos iam dar ao novo aeroporto e a população acorreu em força, passando pela antiga canada Nova, agora transformada numa bonita estrada, em direção á recém-construída aerogare, para apreciar a primeira aterragem de um avião comercial nesta ilha e depois ouvir os discursos da praxe, integrados na cerimónia oficial.

Estavam presentes as mais altas individualidades dos Açores e o primeiro-ministro de Portugal, Dr. Pinto Balsemão. Sinceramente não me recordo, de todo, da ordem das intervenções. Sei que foi o senhor Gui, presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz da Graciosa da altura, que chamou à atenção de todos os presentes e daqueles que viram através da televisão, como eu. Fez um discurso interrompido, de quando em vez, por silêncios em que fartas lágrimas escorriam pelo seu rosto. A emoção tomou conta de muitos dos presentes, que, naquele momento, também sentiram um aperto no peito. Foi a intervenção, de corpo e alma, de um homem que representava o seu povo num momento histórico em que se rompia definitivamente com um isolamento de séculos. O próprio primeiro-ministro referiu esse momento com uma contida emoção.

O senhor Gui Louro foi um dos fundadores nesta ilha do Partido Popular Democrático, agora designado por Partido Social Democrata, e em 12 de dezembro de 1976, data das primeiras eleições autárquicas após a revolução dos cravos, é eleito Presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz da Graciosa. Em 16 de dezembro de 1979 é reeleito e exerce o cargo até ao dia da sua morte.

É na qualidade de responsável autárquico que assiste a outros momentos importantes para a nossa ilha, como a entrada em funcionamento do porto comercial e a inauguração do entreposto frigorífico que, juntamente com o aeroporto, faziam parte dos primeiros grandes investimentos perpetrados depois da conquista da autonomia dos Açores.

O sismo de 1980 foi outro acontecimento que viveu enquanto exercia funções públicas. Foi um momento dramático, sem dúvida, que exigiu dele uma entrega extraordinária tendo em conta a necessidade de organizar todo o processo de reconstrução.



Impulsiona a constituição da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários da Ilha Graciosa, da qual foi sócio fundador. Conta-se que no dia do desembarque da primeira viatura dos bombeiros, feita ainda com o barco ancorado, o comandante do navio ter-se-á recusado a fazer a descarga devido aos riscos que a operação envolvia e foi o senhor Gui Louro que se deslocou ao porto para se responsabilizar pessoalmente por aquela manobra. Hoje essa viatura, embora já fora de serviço, ainda ostenta o seu nome.

Nas suas andanças na atividade política foi ainda, durante um mês, Deputado na Assembleia Regional dos Açores.

Antes de se dedicar à vida pública o senhor Gui foi funcionário do tribunal e, nessa qualidade, chega a viver alguns anos na vizinha ilha Terceira. Quando regressa dedica-se ao comércio e, mais tarde, concorre e exerce funções na Fundação Calouste Gulbenkian que, como se sabe, tinha uma biblioteca itinerante que percorria toda a ilha na busca de leitores. Nessa altura obtém a carteira profissional de solicitador função que exerce em acumulação. Os conhecimentos que possuía nessa área foram-lhe muito úteis aquando das expropriações dos terrenos onde foi construído o aeroporto.  

Nos seus tempos livres gostava de participar em caçadas com os amigos, que acabavam, invariavelmente, em alegres jantaradas. O mergulho também era uma das suas paixões, chegando a dizer aos seus mais próximos que era no mar que se sentia verdadeiramente livre. Dedicava também algum tempo a tratar da sua coleção de selos.

O senhor Gui Louro foi um político determinado e que acreditava no que fazia. Era intransigente quando estava em causa a defesa da sua amada ilha. Ao mesmo tempo era um sonhador e homem de paixões. Pela sua terra fez o melhor que soube e pôde, sem nunca esperar nada em troca.

5 de abril de 2012

Agradar a todos já não pega


Quando a presidente do PSD-Açores vem à Graciosa é em campanha, já sabemos. Noutra condição nunca cá põe os pés, mas isso é uma opção dela e temos de respeitar.

Normalmente escolhe estes momentos para dizer umas coisas que nem lembram ao diabo. Desta vez deu a ideia que quer resolver os problemas dos agricultores e da agricultura Graciosense.

É caso para perguntar:

. Onde andava esta senhora quando o leite era pago irregularmente e com mais de 12 meses de atraso?

. Onde estava quando a fábrica de laticínios fechou por não ter condições para laborar e os produtores ficaram sem rendimento e sem saber o que fazer ao leite?

. Onde andava quando o leite produzido na Graciosa era pago muito abaixo do preço pago em outras ilhas?

. Onde andava quando a Adega Cooperativa foi asfixiada financeiramente, pelo Governo do PSD, ao ponto de ter de encerrar portas?

. Onde andava esta senhora quando a agricultura definhava, sem quaisquer produções alternativas?

Estava no Governo. Podem dar as cambalhotas que quiserem para fazer passar a ideia que a Dra. Berta Cabral nada tinha a ver com isto, mas, o que é um facto indesmentível, é que fazia parte do Governo Regional da responsabilidade do PSD ou gravitava à sua volta. Por mais que os seus apoiantes queiram e tentem, nunca o poderão esconder.

Esta é que é a verdade. A Dra. Berta Cabral, naquele tempo em que os agricultores Graciosenses lutavam para sobreviver, podia fazer muito por eles, se quisesse, mas não fez absolutamente nada para evitar o colapso iminente de um setor que não tinha futuro à vista. Por isso nunca poderá isentar-se de responsabilidades na quase liquidação de um setor que foi necessário reerguer das cinzas a partir de 1996.

Hoje, felizmente, a Dra. Berta Cabral pode ver, quando por cá passa, uma agricultura moderna, com agricultores jovens e confiantes no futuro, com investimentos que rivalizam com os melhores dos Açores. Pode ver uma ilha que conquistou um elevado estatuto sanitário e com um rendimento por hectare superior à média regional. Pode ver a nova e moderna fábrica de laticínios, cuja construção o Governo a que pertenceu nunca teve a coragem de fazer. Pode ver que os produtores de leite recebem a tempo e horas, tal como pode apreciar investimentos em floricultura e horticultura, inexistentes no seu tempo. E pode constatar, ainda, que existem projetos importantes em desenvolvimento como a Adega e Cooperativa, o Centro de Recria ou o Matadouro Industrial.

Ainda não há muito tempo esteve cá e falou muito bem deste setor, tal como o tinha feito a Dra. Maria do Céu Patrão Neves, mas agora mudou repentinamente de opinião. Porque será? Só pode ser por as coisas não lhe estarem a correr de feição.

A presidente do PSD-Açores, nesta sua frenética pré-campanha, preocupa-se em estar com estes e com aqueles, prometendo tudo, numa estratégia de agradar a todos, que, como se sabe, é contrária ao sentido de estado que um candidato a presidente do Governo deve ter.