27 de março de 2006

Tiro no pé

É verdade que a política e os políticos nem sempre são bem vistos. É verdade que a degradação da imagem da política vem de longe, de muito longe. Não é menos verdade também que é importante corrigir essa imagem pouco abonatória e nada dignificante.

Foram feitos alguns avanços recentemente, com apelos de todas as áreas para a dignificação da acção política e com a supressão de muitos privilégios que, de certa maneira, eram uma ofensa aos cidadãos porquanto grande parte do povo português vivia e vive com dificuldades de várias ordens, sendo a financeira uma das mais relevantes.

Tudo isto a propósito das afirmações do líder do principal partido da oposição numa conferência de imprensa a 13 de Março, de que a Assembleia Legislativa produzia muito pouco. Se ainda estivesse a referir-se ao seu Grupo Parlamentar, pouco haveria a dizer, pois ele lá saberá com quem trabalha. Na verdade ele acusou uma instituição mesmo numa altura em que todos a querem dignificar por ser, no fundo, o pilar do edifício autonómico. Foi um péssimo serviço e para mais despoletado a partir da própria sede da Assembleia, o que também é incompreensível, pelo menos para mim.

Claro que isto não ficou assim. Dias depois lá o seu partido apresentava apressadamente uma série de quatro diplomas, alguns até de legalidade duvidosa, para justificar a posição do chefe, que ainda muito recentemente declarava um súbito amor parlamentarista que parecia sincero, mas que naquela segunda-feira -tinha de ser numa segunda-feira, pois só lá vai nesse dia – constou ser afinal um falso amor.

Percebo que neste fulgor inicial e em virtude da necessidade imperiosa de se afirmar internamente, precise de aparecer muitas vezes perante a comunicação social para criar factos políticos, mas ainda estou com aqueles que pensam que a qualidade é mais importante do que a quantidade. É preciso juntar muito bom senso à insaciável necessidade palradora, senão corre-se o risco de dar um tiro no próprio pé.

Há um provérbio inglês que reza: “quando apontares com um dedo, lembra-te que outros três dedos apontam para ti”. Nada de mais verdadeiro.

20 de março de 2006

Prata para serviço de Ouro

Foi a partir de 1980 - ano em que o grupo central dos Açores foi fustigado pela fúria de um sismo que arrasou 60% das ilhas Terceira, S. Jorge e Graciosa e cujas consequências dramáticas são por todos conhecidas - que houve um esboço para criar uma nova dinâmica, de expandir e descentralizar meios com capacidade de intervenção em caso de catástrofe, que, afinal, poderia acontecer em qualquer altura e em qualquer ilha do nosso arquipélago, conforme o sismo daquele primeiro dia de Janeiro tinha revelado, nesse infeliz e terrível momento da nossa história recente.

Nessa altura, e decorrendo também das primeiras conquistas da Autonomia dos Açores instituída em 1975, foram estabelecidos parâmetros pela Administração Regional, embora flexíveis, que apontavam para a constituição de uma corporação por ilha e da existência de um corpo de bombeiros por cada 20.000 habitantes ou raio de actuação de 15 km.

Os Açorianos, e neste caso particular os Graciosenses, estavam habituados a uma vida dura, entregues a si próprios, cultivando a arte de sobreviver ao sabor das intempéries e dos fenómenos da natureza, ambos tão pródigos nestes pedaços de terra semeados na imensidão do oceano.

A 17 de Março de 1981 foi constituída a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários da Ilha Graciosa, decorrendo da necessidade imperiosa que o Governo Regional em funções naquela época, sentia em criar uma estrutura que garantisse eficazmente a protecção de vidas e de bens dos Graciosenses.

O impulso inicial foi dado pelo Presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz da Graciosa daquele tempo, Senhor Gui Weber Bettencourt Louro, que vestido das funções do mais alto representante da população, percebeu ser imperioso dotar a Graciosa destes meios, enquanto o Senhor Vasco Weber Santos Vasconcelos, imbuído da sua conhecida dinâmica e espírito de entrega, assumia a primeira Direcção da Associação, que tinha apenas vinte sete associados.

O primeiro corpo de bombeiros, comandado pelo Senhor Manuel Santos Ataíde Bettencourt, contava com catorze efectivos, uma viatura e algum material. Era, certamente, um grupo com limitações advindas da falta de formação, próprias de um primeiro ciclo de qualquer associação do género, o período de fundação, mas que rapidamente se adaptou às novas exigências requeridas por um corpo de bombeiros moderno e eficaz, como convém.

Por via de um novo quadro orgânico instituído no Decreto Legislativo Regional 24/2003/A de 7 de Agosto, sedimentado na concentração do Serviço de Protecção Civil e da Inspecção Regional de Bombeiros num único serviço, o Serviço Regional de Protecção Civil e Bombeiros dos Açores, mediante a nova perspectiva da entidade públicas, foram dados novos passos para a abertura de um novo ciclo de pujança na protecção civil, como nunca antes fora visto.

A construção de uma verdadeira protecção civil é uma responsabilidade do Estado, é certo, mas não será menos verdadeiro afirmar que é também uma responsabilidade de todos. É preciso, digo mais, é urgente, todos os cidadãos interiorizarem que são eles os primeiros agentes desta cadeia.

O esforço financeiro, a dotação de meios técnicos e a formação já deram resultados. No dia Internacional da Protecção Civil foi considerado que a Região têm um dos melhores serviços do País. Para a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários da Graciosa é também uma honra dar um contributo para esse sucesso.

Depois da construção da sua sede em Agosto de 1989 foi necessário proceder à sua ampliação já no ano de 2003. Por outro lado a modernização do seu equipamento tem sido uma constante, enquanto a formação foi sempre uma das preocupações principais do corpo de bombeiros que, entretanto, adquiria novas responsabilidades.

Em 1991 passa a prestar o serviço de transporte de doentes e de socorro, recentemente passou a prestar serviço de bombeiros no aeroporto e futuramente passará a ter uma unidade de socorro a náufragos devidamente equipada e formada especificamente para esse fim.

Dentro das suas competências, o corpo de bombeiros registou no ano passado 2.327 ocorrências, mais 5,8 % do que em 2004 e mais 24,9 % do que em 2003. Estes números não são desprezíveis e confirmam a importância cada vez maior que o corpo de bombeiros tem para sociedade onde está inserido.

A vida desta instituição depende directamente dos seus associados, aliás como todas as outras, quer culturais, quer desportivas. No entanto tem vindo a verificar-se uma degradação da relação dos sócios com a Associação, o que me parece deveras preocupante. Isso tem-se notado nas últimas Assembleias-gerais, praticamente desertas.

É preciso inverter rapidamente esta situação e uma das soluções passa pelo aumento do número de sócios, através de campanhas e uma delas poderia muito bem ser “UMA FAMÍLIA UM SÓCIO”, até porque esta coisa de desgraças é hoje a um, amanhã a outro, mas normalmente toca a todos…

É fundamental enaltecer o importante serviço realizado ao longo destes 25 anos pelos efectivos deste quartel e pelas pessoas que integram os diversos órgãos sociais, que, em prejuízo das suas famílias e amigos, têm dedicado os seus tempos livres a esta Associação e na prossecução dos seus elevados objectivos, honrando sempre o lema “PARA SERVIR E DAR A VIDA”.

13 de março de 2006

Os votos que contam

O sistema eleitoral em vigor na Região Autónoma dos Açores tem sido, de certo modo, um bom sistema que alia o modelo de representação proporcional, à característica geográfica específica das nossas ilhas, que, por vezes, cria problemas pela diversidade, mas é de facto a nossa maior riqueza.

O alerta foi dado em 1996 quando o partido mais votado teve os mesmos mandatos que a oposição. Para mais, futuramente corria-se também o risco, ainda maior, de o partido mais votado não poder formar governo por ter menos mandatos que a oposição.

A possibilidade dos vencedores nas urnas serem derrotados em mandatos na Assembleia era e é bem real, o que seria uma aberração.

Estes desvios advém exactamente do esforço do legislador em proteger, da melhor forma possível, a representação por ilha, o círculo eleitoral, mas cria, por outro lado, uma situação de injustiça, já que nas nove ilhas a relação do número de eleitores com a distribuição de mandatos é deveras distorcida, penalizando claramente as ilhas com mais eleitores.

Por isso foi necessário proceder a uma análise exaustiva do actual sistema para detectar os efectivos problemas, apontar as diversas soluções e apresentar uma proposta que fosse consensual, se possível.

No debate mantido em sede da Assembleia Legislativa, nomeadamente na Comissão criada para o efeito, o PSD-A, na ânsia de andar sempre à frente e desdobrando-se em sucessivas aparições públicas, ziguezagueou entre diversos projectos de propostas. É conhecido também a realização de um referendo interno que, pura e simplesmente, foi ignorado.

A proposta, que mereceu o apoio do PS e CDS/PP, prevê um aumento de 5 mandatos, num novo círculo eleitoral de compensação a juntar aos nove já existentes, com o aproveitamento dos votos que sobram. Assim melhora-se a proporcionalidade sem beliscar os círculos de ilha e elimina-se o risco de a formação partidária mais votada não obter o maior número de mandatos.

A verdade é que nunca se chegou a perceber bem qual a proposta do PSD-A e só depois da entrega da proposta aprovada pelo PS e CDS/PP na Assembleia da República é que essa formação partidária clamou por consensos. Já era tarde…
Agora apenas resta ao PSD-A apelar ao veto do novo Presidente da República, que aliás já fez, o que denota grande vontade de ganhar a todo o custo este “combate”, nem que seja na secretaria…

6 de março de 2006

Representante ou "Reizinho"?

Recentemente veio até à praça pública uma proposta de projecto-lei que o Dr. Mota Amaral apresentou na Assembleia da República, destinada a aperfeiçoar o estatuto do Representante da Republica nas Regiões Autónomas, que, como se sabe, virá substituir a figura de Ministro da República, já a partir de 9 de Março, conforme o previsto na última revisão da Constituição Portuguesa.

Até aqui nada de novo, já que o Dr. Mota Amaral é um legislador.

Não fora a urgência, o exagero nas regalias do cargo, incluindo remunerações e despesas de representação, as exigências de aumentar significativamente a posição protocolar (claramente acima dos Presidentes da Assembleia Regional e do Governo), certamente que ninguém teria reparado, nem sequer levado a mal.

Só para se ter uma ideia, esta proposta do Dr. Mota Amaral prevê que o Representante da República aufira 70 % do vencimento do Presidente da República (actualmente o Ministro da República aufere 65 % desse valor), mais 40 % em despesas de representação, vencimentos extraordinários em Junho e Novembro (porquê?), direito a transporte, ajudas de custo e residência oficial, nas actuais instalações e, ainda, obras urgentes no palácio Praia e Monforte em Ponta Delgada também para residência oficial. Este último imóvel, ao que se sabe, até estaria destinado à instalação de serviços do actual tribunal, que já não tem condições.

Confesso que sempre admirei o Dr. Mota Amaral, muito embora nem sempre alinhasse pelo seu pensamento ou pelos seus actos, como é absolutamente natural. Reconheço também, e nisto não estarei só, que foi e é um autonomista convicto, um dos pioneiros da construção do edifício autonómico. Por isso terá sempre o meu respeito e admiração.

Contudo, e porque também sei que o Dr. Mota Amaral sempre fez frente à República e aos seus representantes (lembram-se das gravatas pretas na Assembleia Regional?) e até, por diversas vezes, defendeu a extinção do cargo de Ministro da República, não quero acreditar que esteja a fabricar um “fato por medida”, não quero acreditar que o Dr. Mota Amaral venha a ser a personalidade convidada pelo Presidente da República para Representante na Região Autónoma dos Açores, não querendo acreditar também que o Dr. Mota Amaral seja capaz de utilizar o cargo que desempenha actualmente para criar um trono dourado.

A ver vamos…

2 de março de 2006

Baixezas

O termo “baixa” descreve e é utilizado em várias situações: a baixas no mar que não são mais do que montanhas subaquáticas, as baixas nas equipas desportivas ou profissionais quando não podem contar com alguém que faz realmente falta, as baixas de forma, etc. Mas a utilização mais corrente é a denominação do documento que assinala uma doença e respectivo justificativo para faltar ao trabalho.

O direito à segurança social está consagrado no artigo 63º da Constituição da República Portuguesa, nomeadamente no ponto 3, onde se lê: “O sistema de segurança social protege os cidadãos na doença, velhice, invalidez, viuvez e orfandade, bem como no desemprego e em todas as outras situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou capacidade para o trabalho.”

Percebemos assim o alcance deste artigo, que constitui, sem dúvida, um direito fundamental que os legisladores consagraram na nossa Constituição. São regalias que nos assistem, mas é preciso não esquecer que também temos obrigações: o dever de contribuir e a utilização destes mecanismos legais com verdade e transparência.

Nos últimos tempos tem-se assistido ao esforço do poder político em fiscalizar cada vez mais a utilização das baixas, por se saber que a fraude é cada vez mais frequente. Actualmente ainda se justifica mais apertar a fiscalização, quando se antevê, um futuro próximo, dificuldades financeiras ou mesmo ruptura da segurança social.

O leitor já reparou o tamanho da injustiça originada por baixas fraudulentas? É o professor que chega mais tarde das férias escolares, é o funcionário público que, para não “mexer” com as férias, mete baixa sempre que precisa de uns dias de descanso.

Um pouco perplexo ouvi recentemente alguém dizer, como se de um acto perfeitamente normal se tratasse e sem qualquer constrangimento, que um familiar vinha de férias e para estar mais tempo com ele, ia meter uma baixa. É uma injustiça porque somos nós todos a pagar e porque, à custa de uma mentira, conseguem assim mais dias de descanso do que os colegas honestos e cumpridores.