Foi aqui na Ilha Graciosa que dei
os primeiros passos. Foi aqui que rasguei a pele em brincadeiras de crianças
felizes, que sarei feridas lambidas pelo tempo e que fiz amigos para a vida.
Foi aqui que aprendi a ler, a escrever e a contar. Foi aqui que aprendi a
respeitar.
Nunca me senti preso na ilha. O
isolamento que a insularidade e a fúria do tempo por vezes nos impingem nunca
foi uma fatalidade incontornável. A ilha, se calhar, ganhou alguma coisa com
isso. Enriqueceu-se em termos culturais, moldou-se às dificuldades e manteve a
sua natureza intocável.
A Graciosa foi o porto de partida
e de chegada quando, ainda criança, tive de sair. Voltei sempre e cada vez que
voltava mais gostava das vistas do Monte da Ajuda e da Senhora da Saúde, com as
vilas a seus pés, de apreciar o Carapacho e a Beira Mar da Luz, lugares
prazenteiros, de admirar a bela planície do Guadalupe e os vinhedos da Vitória,
que tanta riqueza geraram.
Nesses regressos gostava de rever
amigos, jogar à bola em S. Francisco, ou à barra na Praça, ao rato de sociedade
ou ao quartel-general pelas ruas de Santa Cruz. Retomava os cheiros, ia à
mercearia do senhor Juvenal Martins ou à barraca do senhor Manuel Augusto, onde
se comprava fiado. Mergulhava nas águas límpidas da Fonte da Areia, das
Fontinhas ou do Boqueirão. Requisitava livros na biblioteca itinerante para os
ler a fio noite fora à luz de uma vela.
As coisas mudaram. Hoje já
ninguém lê à luz de uma vela ou tem de sair com 11 ou 12 anos para estudar.
Hoje os jovens saem com o 12º ano para as universidades, muito mais maduros e
autónomos.
Hoje sai-se de avião, joga-se com
uma consola, lê-se no Ipad e tiram-se
dúvidas no Google. Hoje quando se
quer “matar” saudades liga-se o telemóvel, o Skype ou o Facebook.
Tudo mudou, mudaram o mundo,
Portugal, os Açores e a Graciosa. A Revolução de Abril de 1974 abriu as portas
à Autonomia dos Açores e esta, por sua vez, tratou de colocar todas as ilhas no
mesmo patamar. A revolução tecnológica fez o resto.
Em 2004 iniciei a minha atividade
no mundo da política. Foi com muita honra que aceitei o encargo, nem sempre
fácil, de defender os Açores e a Ilha Graciosa, o meu círculo eleitoral. Numa
ilha pequena, onde todos se conhecem, o exercício de um cargo público
reveste-se de outra dimensão, a proximidade entre o eleito e o eleitor que acarreta
outras responsabilidades e impõe uma ação mais exigente.
Durante estes anos tive a
felicidade de assistir à fase de maior investimento de sempre nesta ilha.
O sector primário foi
reestruturado profundamente. As condições criadas, nomeadamente com a
construção da nova fábrica de lacticínios, do porto de pescas com respetivos
equipamentos de apoio, aliados ao redimensionamento das explorações agrícolas e
à renovação da frota pesqueira, possibilitaram o rejuvenescimento e a
profissionalização destas classes, fatores que deram um novo impulso à economia
da ilha.
Por outro lado, o Governo dos
Açores avançou com a construção de um centro de apoio ao visitante da Furna do
Enxofre, ex-libris desta ilha, e, substituindo a iniciativa privada em
investimentos estruturais, construiu um hotel de quatro estrelas dando início,
assim, a uma nova atividade económica, o turismo.
A par desta visão de
desenvolvimento, que se quer sustentado, foi possível dar uma especial atenção
aos assuntos sociais com a inauguração de um novo centro de saúde, a
requalificação de um lar de idosos e a construção de um outro lar. O ambiente e
os transportes também sofreram transformações importantes.
Não está tudo feito, no entanto
foram criadas as bases para se passar a uma nova fase em que o empreendedorismo
poderá ajudar a fazer o que resto.
(artigo publicado no jornal
digital Mundo Açoriano em 28 de Junho de 2013)